O governo de Minas Gerais deve mais de R$ 20 milhões aos advogados dativos do estado, segundo a seccional local da Ordem dos Advogados do Brasil. Essa inadimplência resultou, até o momento, em mais de 70 mil ações de cobrança no Tribunal de Justiça do estado.
As informações foram divulgadas em entrevista coletiva concedida pelo presidente da OAB-MG, Antonio Fabrício de Matos Gonçalves, nesta quarta-feira (13/9). Segundo ele, o problema se arrasta desde 2013, quando o governo deixou de pagar os dativos administrativamente, e decidiu só pagar em caso de derrota judicial.
Ele diz ainda que o problema pode ser maior, pois há advogados com certidão que ainda não cobraram e outros que não ajuizaram ações. Gonçalves conta que as tratativas entre a OAB-MG e o governo começaram na sua gestão, em 2016. Como resultado, o Executivo pagou parte da dívida: R$ 500 mil no fim daquele ano.
Mas o problema se aprofundou, segundo o presidente da seccional, depois que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais reconheceu Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva em processo que discute se o governo pode pagar valores diferentes dos definidos na tabela da OAB. Gonçalves afirma que a falta de pagamento a esses profissionais é preocupante, também porque 60% das comarcas de MG não têm defensores públicos.
Questionado pela ConJur, o governo mineiro afirmou estar “empenhado em solucionar a questão dos advogados dativos”. Destacou ainda que o governador Fernando Pimentel (PT) vai assinar, no dia 20 de setembro, protocolo de quitação do passivo, com um cronograma de pagamentos “dentro da realidade financeira do estado”. A Defensoria Pública não se manifestou até a publicação desta reportagem.
Exemplo paulista
O atraso no pagamento dos dativos não é novidade nem exclusividade mineira. Em 2015, a seccional paulista da OAB também enfrentou problemas com o repasse de verbas aos advogados que atuam conjuntamente com a Defensoria Pública no estado. Ao contrário do que acontece em MG, os pagamentos eram feitos pela Defensoria, que reteve pagamentos, resultando em um embate que chegou ao Supremo Tribunal Federal.
A briga começou em 4 de dezembro daquele ano, com a seccional paulista classificando, por meio de nota, o atraso como “inadmissível”. À época, o presidente da OAB-SP, Marcos da Costa, afirmou que tomaria todas as medidas cabíveis — ele chegou até a discutir o tema com o governador Geraldo Alckmin — e que a falta de pagamento ocorreu por ingerência. “O erro foi de planejamento, porque a Defensoria sempre usou o fundo [judiciário] até o limite.”
No dia 11 de dezembro, a OAB-SP e o governo paulista firmaram acordo para que a administração estadual repassasse suplementação de verba à Defensoria para que o órgão pagasse os advogados que atuam por meio do convênio na semana seguinte. Como até o dia 16 nada foi transferido, Marcos da Costa foi à Assembleia Legislativa paulista pedir aos deputados estaduais a rejeição do Projeto de Lei Complementar 58/2015, que aumentaria os salários dos defensores públicos de SP. Porém, a votação não ocorreu no dia por falta de quórum, e o assunto ficou para 2017.
“Conversei com muitos deputados, que se mostraram sensíveis ao apelo da OAB-SP. Espero que eles rejeitem o projeto”, disse Marcos da Costa no dia em que visitou a Assembleia. Em resposta, a Defensoria Pública explicou que os valores previstos no projeto não são vinculados ao fundo de assistência, mas ao aporte de recursos financeiros, e que o PLC é fundamental para o órgão.
O projeto, aprovado pela Alesp em dezembro de 2016, alterou a Lei Complementar estadual 988/2006, que garante 40% da verba do Fundo de Assistência Judiciária ao pagamento dos honorários de advogados dativos. A norma foi sancionada pelo governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, em janeiro deste ano.
Em fevereiro deste ano, a Defensoria Pública de São Paulo e a seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil pediram para entrar como amici curiae em ação que tramita no STF contra norma estadual que reserva 40% da verba do Fundo de Assistência Judiciária para honorários de advogados dativos.
Na prática, a OAB-SP e a Defensoria demonstram visões divergentes sobre a validade desse fundo. Segundo o presidente da primeira entidade, Marcos da Costa, o dinheiro que deveria ser revertido para assistência a pessoas hipossuficientes tem sido usado para cobrir gastos da Defensoria Pública com pagamento de atrasados e até com aluguel de carros (mais de R$ 2 milhões), “esvaziando um fundo que tinha mais de R$ 800 milhões”.
Já o defensor público-geral de São Paulo, Davi Eduardo Depiné Filho, afirma que o uso do fundo passou a ser necessário diante do pequeno orçamento destinado pelo Tesouro estadual. Hoje, o Fundo de Assistência Judiciária representa cerca de 90% de todas as receitas da instituição que comanda. A nova lei, de acordo com Depiné Filho, cortaria 36% do caixa da Defensoria, tirando a sua autonomia e impedindo o funcionamento de suas atividades.